29 de outubro de 2014

Relatório final do Sínodo dos Bispos Extraordinário



O olhar sobre Cristo: o Evangelho da família


Comparação: perspectivas pastorais



INTRODUÇÃO 

1. O Sínodo dos Bispos reunidos em torno do Papa dirigiu a sua atenção a todas as famílias de todo o mundo, com as suas alegrias, as suas dificuldades e as suas esperanças. Em particular, sente a necessidade de agradecer ao Senhor pela fidelidade generosa com que tantas famílias cristãs respondem à sua vocação e missão. Fazem-no com alegria e fé, mesmo quando o caminho familiar as coloca perante obstáculos, incompreensões e sofrimentos. Estas famílias devem ter o apreço, gratidão e encorajamento de toda a Igreja e deste Sínodo. Na vigília de oração celebrada na Praça de São Pedro sábado, 4 outubro, 2014, em preparação para o Sínodo sobre a Família, o Papa Francisco evocou de maneira simples e concreta a centralidade da experiência familiar na vida real, expressando-se assim: "Vai descendo a noite sobre a nossa assembleia. É o momento em que se regressa de bom grado a casa para se reencontrar na mesma mesa, na espessura dos afectos, do bem realizado e recebido, dos encontros que aquecem o coração e o fazem crescer, o vinho bom que antecipa na vida humana a festa sem fim. É também a hora mais pesada para aqueles que agora se vêem cara a cara com sua própria solidão, no crepúsculo amargo de sonhos e projectos quebrados: quantas pessoas arrastam os seus dias no beco sem saída da resignação, do abandono, até mesmo do ressentimento; em quantas casas faltou o vinho da alegria e, portanto, o sabor - a própria sabedoria - da vida [...]. De uns e de outros, esta noite, tornemo-nos vozes com a nossa oração, uma oração para todos ".

2. Seio de alegrias e provações, de afectos profundos e relações, por vezes, feridas, a família é realmente "escola de humanidade" (cf. Gaudium et Spes, 52), de que se sente fortemente a necessidade. Apesar dos muitos sinais da crise da instituição familiar nos diferentes contextos da "aldeia global", o desejo da família permanece vivo, especialmente entre os jovens, e motiva a Igreja, perita em humanidade e fiel à sua missão, a anunciar sem descanso e com profunda convicção o "Evangelho da família", que foi confiado com a revelação do amor de Deus em Jesus Cristo e constantemente ensinada pelos Padres, pelos Mestres de espiritualidade e pelo Magistério da Igreja. A família assume para a Igreja especial importância e no momento em que todos os crentes são convidados a sair de si mesmos é necessário que a família se redescubra como sujeito imprescindível para a evangelização. Os nossos pensamentos vão para o testemunho missionário de tantas famílias.

3. Para reflectir sobre a realidade da família, decisiva e valiosa, o Bispo de Roma convocou o Sínodo dos Bispos, na sua Assembléia Geral Extraordinária, em outubro de 2014, para, em seguida, aprofundar a reflexão, a Assembleia Geral Ordinária a realizar em outubro 2015, bem como todo o ano que decorre entre os dois eventos sinodais. "Pois, o convergir em unum em torno do Bispo de Roma é um evento de graça, no qual a colegialidade episcopal se manifesta num processo de discernimento espiritual e pastoral": foi assim que o Papa Francisco descreveu a experiência do Sínodo, indicando as suas funções na dúplice escuta dos sinais de Deus e da história humana e na dúplice e única fidelidade que daí deriva.

4. À luz do mesmo discurso que colhemos os resultados das nossas reflexões e diálogos em três partes: a escuta, para se olhar para a realidade das famílias de hoje, na complexidade de suas luzes e suas sombras; o olhar fixo em Cristo, para se repensar com renovada frescura e entusiasmo quanto a revelação, transmitida na fé da Igreja, nos fala sobre a beleza, sobre o papel e a dignidade da família; a comparação à luz do Senhor Jesus para se discernirem as formas como se há-de renovar a Igreja e a sociedade no seu compromisso com a família fundada sobre o matrimónio entre homem e mulher.




A escuta: contexto e desafios sobre a família

O contexto sócio-cultural

5. Fiéis ao ensinamento de Cristo olhamos para a realidade das famílias de hoje em toda a sua complexidade, nas suas luzes e sombras. Pensamos nos pais, avós, irmãos e irmãs, parentes próximos e distantes, bem como a ligação entre duas famílias que tece cada casamento. As mudanças antropológicas e culturais influenciam todos os aspectos da vida de hoje e requerem uma abordagem analítica e diversificada. Devem-se ressaltar, antes de mais, os aspectos positivos: a maior liberdade de expressão e um melhor reconhecimento dos direitos das mulheres e crianças, pelo menos nalgumas regiões. Mas, por outro lado, também deve-se considerar o crescente perigo representado por um individualismo exagerado que distorce os laços familiares acabando por considerar cada membro da família uma ilha, fazendo prevalecer, em alguns casos, a ideia de um sujeito que se constrói de acordo com os seus próprios desejos assumidos como um absoluto. Acresce a isso, também, a crise de fé que tem afectado muitos católicos e que muitas vezes está na origem da crise do casamento e da família.

6. Uma das maiores pobrezas da cultura actual é a solidão, fruto da ausência de Deus na vida das pessoas e da fragilidade dos relacionamentos. Há também um sentimento geral de impotência diante da realidade sócio-económica que muitas vezes acaba por esmagar as famílias. É o caso do crescimento da pobreza e do trabalho precário que às vezes é vivido como um autêntico pesadelo, ou por causa de impostos pesados que não incentivam os jovens a casar. As famílias sentem-se muitas vezes abandonadas devido ao desinteresse e falta de atenção por parte das instituições. As consequências negativas em termos de organização social são claras: da crise demográfica às dificuldades educativas, do esforço para acolher uma nova vida ao sentir a presença dos idosos como um peso, até ao alastrar de um desconforto emocional que chega por vezes à violência. É da responsabilidade do Estado criar as condições legais e de trabalho que garantam o futuro dos jovens e os ajude a realizarem os seus planos para fundarem uma família.

7. Há contextos culturais e religiosos que colocam desafios particulares. Em algumas sociedades ainda se mantem a prática da poligamia e, nalguns contextos tradicionais, o costume do “casamento por etapas.” Noutros contextos permanece a prática de casamentos arranjados. Em países onde a presença da Igreja Católica é uma minoria são numerosos os matrimónios mistos e de disparidade de culto, com todas as dificuldades que acarretam no que diz respeito à configuração jurídica, ao baptismo e à educação dos filhos e respeito mútuo, do ponto de vista da diversidade de fé. Nestes casamentos, pode haver o perigo do relativismo ou indiferença, mas pode haver a possibilidade de promover o espírito do ecumenismo e do diálogo inter-religioso em uma coexistência harmoniosa das comunidades que vivem no mesmo lugar. Em muitos contextos, não apenas no Ocidente, vai-se difundindo amplamente a prática de viver juntos antes do casamento ou coabitações não orientadas a assumir a forma de vínculo não institucional. Acresce muitas vezes uma legislação que compromete o casamento e a família. Por causa da secularização, em muitas partes do mundo, a referência a Deus é muito reduzida e a fé deixou de ser partilhada socialmente.

8. Há muitas crianças que nascem fora do casamento, especialmente em alguns países, e muitos os que depois crescem com um dos pais ou num contexto familiar alargado ou constituído. O número de divórcios está a aumentar e não é raro as escolhas serem ditadas unicamente por factores económicos. As crianças são muitas vezes motivo de disputa entre os pais e os filhos são as verdadeiras vítimas das dilacerações familiares. Os pais estão muitas vezes ausentes, não só por razões económicas, lá onde se sente a necessidade de assumirem mais claramente a responsabilidade pelos filhos e pela família. A dignidade da mulher ainda precisa de ser defendida e promovida. Hoje, de facto, em muitos contextos, ser mulher é objecto de discriminação e também o dom da maternidade é muitas vezes penalizado em vez de ser apresentado como um valor. Não devem ser esquecido o fenómeno do aumento dos casos de violência de que são vítimas as mulheres, infelizmente até mesmo dentro da família e o da mutilação genital feminina generalizada nalgumas culturas. A exploração sexual de crianças constitui uma das realidades mais escandalosas e perversas da sociedade actual. Também as sociedades atingidas pela violência devido à guerra, ao terrorismo ou à presença do crime organizado, vêem situações familiares deterioradas principalmente nas grandes metrópoles e nos subúrbios cresceu o chamado fenómeno das crianças de rua. A migração também é outro sinal dos tempos para enfrentar e entender com toda a carga de consequências sobre a vida familiar.

A importância da vida afectiva

9. Tendo em conta a estrutura social definida encontra-se, em muitas partes do mundo, nos indivíduos, uma maior necessidade de cuidar de si mesmo, conhecer-se intimamente, viver melhor em sintonia com as suas emoções e sentimentos, na procura de relações afectivas de qualidade; essa justa aspiração pode abrir o desejo de maior empenho na construção de relacionamentos de doação e de reciprocidade criativa, responsabilizadoras e solidárias como as da família. O perigo individualista e o risco de se viver em atitude egoísta são relevantes. O desafio para a Igreja é ajudar casais no amadurecimento da dimensão emocional e desenvolvimento afectivo, através da promoção do diálogo, da virtude e da confiança no amor misericordioso de Deus. O compromisso total, necessário no casamento cristão, pode ser um poderoso antídoto para tentação do individualismo egoísta.

10. No mundo de hoje não faltam tendências culturais que parecem impor uma afectividade sem limites da qual se querem explorar todas as vertentes, mesmo as mais complexas. De facto, a questão da fragilidade afectiva é muito oportuna: uma afectividade narcísica, instável e mutável que nem sempre ajuda o indivíduo a alcançar maior maturidade. É preocupante a difusão da pornografia e da comercialização do corpo, favorecida também por uma má utilização da Internet e deve ser denunciada a situação daquelas pessoas que são forçadas à prostituição. Neste contexto, os casais estão em tempos de incerteza, hesitantes, lutam para encontrar maneiras de crescer. Muitos são aqueles que tendem a permanecer no estádio inicial da vida emocional e sexual. A crise do casal desestabiliza a família e pode chegar, devido à separação e ao divórcio, a causar graves consequências nos adultos, nos filhos e na sociedade, enfraquecendo o indivíduo e os laços sociais. O declínio da população, devido a uma mentalidade anti-natalidade e a políticas mundiais de saúde reprodutiva, não só leva a uma situação em que não é garantida a sucessão das gerações, mas é susceptível de conduzir ao longo do tempo a um empobrecimento económico e a uma perda de esperança para o futuro. O desenvolvimento da biotecnologia também teve um grande impacto sobre a taxa de natalidade.

O desafio para a pastoral

11. Neste contexto, a Igreja sente a necessidade de dizer uma palavra de verdade e de esperança. Deve começar a partir da crença de que o homem vem de Deus e que, portanto, uma reflexão capaz de reproduzir as grandes questões sobre o significado de ser humano pode encontrar terreno fértil nos anseios mais profundos da humanidade. Os grandes valores do matrimónio e da família cristã correspondem a uma procura que perpassa a existência humana numa época marcada pelo individualismo e pelo hedonismo. É necessário acolher as pessoas com a sua existência concreta, saber apoiar essa procura, incentivar ao desejo de Deus e de se sentir totalmente parte da Igreja, mesmo quem tenha sofrido fracassos ou se encontra nas mais diversas situações. A mensagem cristã tem sempre dentro de si a realidade e a dinâmica da misericórdia e da verdade, que convergem em Cristo.




O olhar de Cristo, o Evangelho da família

O olhar em Jesus e a pedagogia divina na história da salvação

12. A fim de “verificar o nosso passo no terreno fértil dos desafios contemporâneos, a condição decisiva é manter os nossos olhos fixos em Jesus Cristo, fazendo uma pausa na contemplação e adoração do seu rosto [...]. Na verdade, cada vez que voltamos à fonte da experiência cristã, abrem-se novos caminhos possibilidades inimagináveis” (Papa Francisco, discurso de 04 de outubro de 2014). Jesus olhou com amor e ternura para os homens e mulheres que encontrou, acompanhando os seus passos com verdade, paciência e misericórdia, ao anunciar as exigências do Reino de Deus.

13. Tendo em conta que a ordem da criação é determinada pela orientação para Cristo, devemos distinguir, sem separar, os diferentes graus pelos quais Deus comunica à humanidade a graça da aliança. Por causa da pedagogia divina, segundo a qual a ordem da criação evolui para a da redenção através de etapas sucessivas, precisamos de compreender a novidade do sacramento nupcial cristão em continuidade com o casamento natural das origens. Assim se entende o modo do agir salvífico de Deus, tanto na criação como na vida cristã. Na criação, porque todas as coisas foram feitas por meio de Cristo e em vista d’Ele (cf. Col 1,16), os cristãos “façam assomar à luz, com alegria e respeito, as sementes do Verbo neles adormecidas; mas atendam, ao mesmo tempo, à transformação profunda que se opera entre os povos” (Ad gentes, 11). Na vida cristã: com o baptismo o crente é colocado na Igreja através da Igreja doméstica, que é a sua família, ele assume o “processo dinâmico, que avança gradualmente com a progressiva integração dos dons de Deus” (Familiaris Consortio, 11) pela contínua conversão ao amor que nos salva do pecado e dá plenitude de vida.

14. Jesus, referindo-se ao projecto primitivo sobre o casal humano, reafirma a união indissolúvel entre um homem e uma mulher, ao dizer que “por causa da dureza do vosso coração, Moisés permitiu-vos repudiar as vossas mulheres, mas desde o início, não era assim “(Mt 19,8). A indissolubilidade do casamento (“Portanto o que Deus juntou, não o separe o homem” Mt 19,6), não deve ser entendida como “jugo” imposto aos homens, mas como um “dom” dado aos casais unidos em matrimónio. Desta forma, Jesus mostra como a condescendência divina acompanha sempre o caminho humano, cura e transforma o coração endurecido com a sua graça, conduzindo-o para o seu início, através do caminho da cruz. É evidente, a partir dos Evangelhos, que o exemplo de Jesus é paradigmático para a Igreja. Na verdade, Jesus assumiu uma família, começou com os sinais na festa de casamento em Caná, anunciou a mensagem sobre o significado do casamento como a plenitude da revelação que recupera o plano original de Deus (Mt 19,3). Mas, ao mesmo tempo, coloca em prática a doutrina ensinada mostrando assim o verdadeiro significado da misericórdia. Isso é bastante claro nos encontros com samaritana (Jo 4,1-30) e a adúltera (João 8,1-11) em que Jesus, com uma atitude de amor para com a pessoa pecadora, leva ao arrependimento e à conversão (“vai e não voltes a pecar”), uma condição para o perdão.

A família no plano salvífico de Deus;

15. As palavras de vida eterna que Jesus deixou aos seus discípulos incluem o ensinamento sobre o casamento e a família. Este ensinamento de Jesus permite-nos distinguir em três etapas principais o plano de Deus sobre o matrimónio e a família. No princípio há a família de origem, quando Deus Criador instituiu o casamento primordial entre Adão e Eva, como a base sólida da família. Deus não criou apenas o ser humano, homem e mulher, (Gênesis 1:27), mas também os abençoou para que fosse fecundos e se multiplicassem (Gn 1:28). Por esta razão, “o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher e os dois serão uma só carne” (Gn 2:24). Esta união foi corrompida pelo pecado e tornou-se a forma histórica deo matrimónio no Povo de Deus, sobre o qual Moisés deu a possibilidade da emissão de um certificado de divórcio (cf. Dt 24, 1 e ss). Esta forma foi predominante na época de Jesus. Com a sua chegada e a reconciliação do mundo caído, mediante a redenção que Ele realizou, terminou a era inaugurada por Moisés.

16. Jesus, que em Si reconciliou todas as coisas, reconduziu o casamento e a família à sua forma original (Mc 10,1-12). A família e o casamento foram redimidos por Cristo (cf. Ef 5,21-32), restaurados à imagem da Santíssima Trindade, o mistério do qual emana todo o amor verdadeiro. A aliança nupcial, inaugurada na criação e revelada na história da salvação, recebe a revelação plena do seu significado em Cristo e na sua Igreja. Por Cristo através da Igreja, o matrimónio e a família recebem a graça necessária para testemunharem o amor de Deus e viverem uma vida de comunhão. O Evangelho da família atravessa a história do mundo desde a criação do homem à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1, 26-27) até a conclusão do mistério da Aliança em Cristo no fim dos tempos com as núpcias do Cordeiro (Ap 19,9; João Paulo II, Catequeses sobre o amor humano).

A Família nos documentos da Igreja

17. “Ao longo dos séculos, a Igreja não faltou com o seu ensinamento constante sobre o matrimónio e a família. Uma das maiores expressões desse ensinamento foi proposto pelo Concílio Vaticano II, na Constituição Pastoral Gaudium et Spes, que dedica um capítulo inteiro à promoção da dignidade do matrimónio e da família (cf. Gaudium et Spes, 47-52). Definiu o matrimónio como uma comunidade de vida e de amor (cf. Gaudium et Spes, 48), colocando o amor no centro da família, mostrando, ao mesmo tempo, a verdade do amor na frente das várias formas de reducionismo na cultura contemporânea. O “verdadeiro amor entre marido e mulher” (Gaudium et Spes, 49) envolve uma doação recíproca, inclusão e integração da dimensão sexual e a afectividade, correspondendo ao plano divino (cf. Gaudium et Spes, 48-49). Além disso, Gaudium et Spes 48 sublinha o enraizamento dos esposos em Cristo: Cristo Senhor “vai ao encontro dos cônjuges cristãos no sacramento do matrimónio,” e com eles permanece. Na encarnação, Ele assume o amor humano, purifica-o, leva-o à plenitude e dá aos noivos, com o seu Espírito, a capacidade de viver, que permeia toda a sua vida de fé, esperança e caridade. Desta forma, os esposos estão como que consagrados e, por meio de uma graça própria, edificam o Corpo de Cristo e constituem uma Igreja doméstica (cf. Lumen gentium, 11), de forma que a Igreja, a fim de compreender plenamente o seu mistério, olha para a família cristã, que o manifesta de uma forma genuína “( Instrumentum Laboris, 4).

18. “Na esteira do Concílio Vaticano II, o Magistério pontifício aprofundou a doutrina sobre o matrimónio e a família. Em particular, Paulo VI, na Encíclica Humanae Vitae, pôs em evidência a estreita ligação entre o amor conjugal e da geração da vida. São João Paulo II dedicou uma atenção especial à família através da sua catequese sobre o amor humano, a Carta às Famílias (Gratissimam Sane) e, especialmente, com a Exortação Apostólica Familiaris Consortio. Nestes documentos, o Papa definiu a família “o caminho da Igreja”; ofereceu uma visão de conjunto sobre a vocação ao amor do homem e da mulher; propôs as linhas fundamentais para a pastoral da família e da presença da família na sociedade. Em particular, o tratamento da caridade conjugal (cf. Familiaris consortio, 13), descreveu a forma em que o casal, no seu amor mútuo, recebe o dom do Espírito de Cristo e vive a sua vocação à santidade “( Instrumentum Laboris, 5 ).

19. “Bento XVI, na Encíclica Deus Caritas Est, retomou o tema da verdade do amor entre homem e mulher, que se ilumina totalmente só à luz do amor de Cristo crucificado (cf. Deus Caritas Est, 2). Ele salienta como: “O matrimónio baseado num amor exclusivo e definitivo se torna o ícone do relacionamento entre Deus e o seu povo e vice-versa: a maneira de amar de Deus torna-se a medida do amor humano” (Deus Caritas Est, 11). Além disso, na Encíclica Caritas in Veritate, destacando a importância do amor como princípio da vida em sociedade (cf. Caritas in veritate, 44), um lugar onde se aprende a experiência do bem comum “( Instrumentum Laboris, 6).

20. «O Papa Francisco na Encíclica Lumen Fidei abordando a ligação entre família e fé, escreve: “O encontro com Cristo, deixando-se agarrar e guiar pelo seu amor, alarga o horizonte da vida, dá esperança sólida, que não decepciona. A fé não é um abrigo para pessoas sem coragem, mas a expansão da vida. Ela revela um grande apelo, a vocação ao amor, e a garantia de que este amor é fiável, que vale a pena entregar-se a ele, porque sua fundação está na fidelidade de Deus, mais forte do que toda a nossa fraqueza” (Lumen Fidei, 53)» (Instrumentum Laboris, 7).

A indissolubilidade do matrimónio e a alegria de viver juntos

21. O dom recíproco constitutivo do matrimónio sacramental está enraizado na graça do baptismo, que estabelece a aliança básica de todas as pessoas com Cristo na Igreja. Na aceitação mútua e pela graça de Cristo os noivos prometem-se dom total, fidelidade e abertura à vida, eles reconhecem como elementos constitutivos matrimónio os dons que Deus lhes oferece, levando a sério o seu compromisso recíproco, em seu nome e perante a Igreja. Agora, na fé, é possível assumir os bens do matrimónio como compromissos mais sustentáveis através da ajuda da graça do sacramento. Deus consagra o amor dos esposos e confirma a sua indissolubilidade, oferecendo-lhes a ajuda para viverem a fidelidade, a integração recíproca e a abertura à vida. Por isso, o olhar da Igreja volta-se para os cônjuges como o coração de toda a família, a qual também dirige o olhar para Jesus.

22. Na mesma linha, fazendo nosso o ensinamento do Apóstolo de que toda a criação foi concebida em Cristo e em vista d’Ele (cf. Col 1,16), o Concílio Vaticano II quis expressar apreço pelo casamento natural e pelos aspectos válidos das outras religiões (Nostra Aetate, 2) e culturas, apesar das limitações e deficiências (cf. Redemptoris missio, 55). A presença das sementes do Verbo nas culturas (cf. Ad Gentes, 11) poderia ser aplicada, nalguns aspectos, à realidade matrimonial e familiar de tantas culturas e pessoas não cristãs. Portanto, há elementos válidos, de alguma forma, fora do matrimónio cristão – no entanto com base na relação estável e fiel de um homem e uma mulher – que consideramos estarem orientados para ele. Com um olhar para a sabedoria humana de povos e culturas, a Igreja também reconhece a família como célula básica da sociedade humana necessária e fecunda da convivência humana.

A verdade e a beleza da família e a misericórdia para com as famílias feridas e frágeis

23. Com profunda alegria e profunda consolação, a Igreja olha para as famílias que permanecem fiéis ao ensinamento do Evangelho, encorajando-as e agradecendo-lhes pelo testemunho que dão. Graças a elas, de facto, torna-se credível a beleza do matrimónio indissolúvel, fiel para sempre. Na família, “qual Igreja doméstica” (Lumen Gentium, 11), amadurece a primeira experiência de comunhão eclesial entre as pessoas, o que é reflectido pela graça, o mistério da Santíssima Trindade. “É aqui que se aprende a tenacidade e a alegria no trabalho, o amor fraterno, o perdão generoso e sempre renovado, e, sobretudo, o culto divino, pela oração e pelo oferecimento da própria vida.” (Catecismo da Igreja Católica, 1657). A Sagrada Família de Nazaré é um modelo maravilhoso, em cuja escola “entendemos porque temos de manter uma disciplina espiritual, se quisermos seguir a doutrina do Evangelho e tornarmo-nos discípulos de Cristo” (Paulo VI, Discurso à Nazaré, 05 de janeiro de 1964). O Evangelho da família, também nutre as sementes que ainda estão a amadurecer, e deve tratar as árvores que secaram e não devem ser negligenciadas.

24. A Igreja, qual mestra segura e mãe atenciosa, embora reconhecendo que, para os baptizados, não há outro vínculo nupcial senão o do matrimónio sacramental, e que qualquer violação do mesmo é contra a vontade de Deus, também está consciente da fragilidade de muitos dos seus filhos que lutam no caminho da fé. “Portanto, sem diminuir o valor do ideal evangélico, deverá acompanhar com misericórdia e paciência as possíveis etapas de crescimento das pessoas que vão sendo construídas dia após dia. [...] Um pequeno passo, no meio de grandes limitações humanas, pode ser mais agradável a Deus do que a vida exteriormente correcta de quem passa os seus dias sem enfrentar sérias dificuldades. A todos deve chegar a consolação e encorajamento do amor salvífico de Deus, que opera misteriosamente em cada pessoa, para além de seus defeitos e das suas quedas” (Gaudium Evangelii, 44).

25. Para uma abordagem pastoral a pessoas que tenham contraído um casamento civil, que são divorciados e que voltaram a casar, ou que simplesmente vivem juntos, cabe à Igreja revelar-lhes a divina pedagogia da graça nas suas vidas e ajudá-las a alcançar nelas mesmas a plenitude do plano de Deus. Seguindo o olhar de Cristo, cuja luz ilumina todo homem (Jo 1.9; Gaudium et Spes, 22), a Igreja dirige-se com amor para aqueles que participam na sua vida de modo incompleto, reconhecendo que a graça de Deus opera também nas suas vidas, dando-lhes coragem para fazerem o bem, cuidar com amor um do outro e estar a serviço da comunidade em que vivem e trabalham.

26. A Igreja encara com preocupação a falta de confiança de muitos jovens no compromisso matrimonial, sofre com a precipitação com que muitos fiéis decidiram pôr fim ao vínculo assumido instaurando outro. Estes membros, que pertencem à Igreja, necessitam de uma atenção pastoral misericordiosa e encorajadora. Os jovens baptizados devem ser encorajados a não hesitar perante da riqueza que alcança para aos seus projectos de amor o sacramento do matrimónio, fortalecidos pelo apoio que recebem da graça de Cristo e pela oportunidade de participar plenamente na vida da Igreja.

27. A este respeito, uma nova dimensão da pastoral familiar actual consiste em prestar atenção à realidade de casamentos civis entre homens e mulheres, aos casamentos tradicionais e, feitas as devidas diferenças, às coabitações. Quando a união chega a uma notável estabilidade através de um vínculo público caracterizando-se pela profunda afeição, responsabilidades para com a prol, capacidade em superar provações, pode ser vista como uma oportunidade para acompanhar no seu desenvolvimento em vista do sacramento do matrimónio. Muitas vezes a convivência é estabelecida não em vista de um possível futuro matrimónio, mas sem qualquer intenção de estabelecer uma relação de instituições.

28. Em conformidade com o olhar misericordioso de Jesus, a Igreja deve acompanhar com atenção e cuidado os seus filhos mais frágeis, marcados pelo amor perdido e ferido, restituindo confiança e esperança, como a luz do farol de um porto ou uma tocha levada para o meio das pessoas para iluminar aqueles que perderam o seu rumo ou estão no meio da tempestade. Conscientes de que a maior misericórdia está em dizer a verdade com amor, vamos mais além da compaixão. O amor misericordioso, assim como atrai e une, também transforma e eleva. Convida à conversão. Assim, da mesma maneira entendemos a atitude do Senhor, que não condena a mulher apanhada em adultério, mas pede-lhe para não voltar a pecar (Jo 8,1-11).



Comparação: perspectivas pastorais 

Anunciar o Evangelho da família, hoje, nos vários contextos

29. O diálogo sinodal debruçou-se sobre alguns casos pastorais mais urgentes a serem confiados à concretização nas Igrejas locais em comunhão “cum Petro et sub Petro”. O anúncio do Evangelho da família é uma necessidade urgente para a nova evangelização. A Igreja é chamada a implementá-lo com ternura materna e clareza de mestra (cf. Ef 4:15), na fidelidade à kenosis de Cristo. A verdade encarna-se na fragilidade humana não para a condenar, mas para salvá-la (cf. Jo 3,16 -17).

30. A evangelização é da responsabilidade de todo o Povo de Deus, cada um de acordo com seu ministério e carisma. Sem o testemunho alegre dos casais e das famílias, Igrejas domésticas, a proclamação, mesmo que correcta, corre o risco de ser mal interpretada ou de submergir no mar de palavras que caracteriza a nossa sociedade (cf. Novo Millennio Ineunte, 50). Os Padres sinodais sublinharam repetidamente que as famílias católicas sob a graça do sacramento do matrimónio são chamadas a serem membros activos da pastoral familiar.

31. O factor decisivo será o de destacar o primado da graça, e, portanto, as possibilidades que o Espírito dá no sacramento. É a experiência da alegria do Evangelho da família que “enche o coração e a vida toda”, pois em Cristo estamos “livres do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento” (Gaudium Evangelii 1). À luz da parábola do semeador (Mt 13,3), a nossa tarefa é a de cooperar na sementeira: o resto é obra de Deus. Também não devemos esquecer que a Igreja que prega sobre a família é sinal de contradição.

32. Para isso requer-se a toda a Igreja uma conversão missionária: não é necessário deter-se num anúncio puramente teórico e desvinculado dos problemas reais das pessoas. Nunca se esqueça de que a crise de fé levou a uma crise do casamento e da família e, como resultado, interrompeu-se muitas vezes a transmissão da mesma fé dos pais para os filhos. Diante de uma fé fortalecida a imposição de certas perspectivas culturais que enfraquecem a família e o casamento não tem efeito.

33. A conversão deve acontecer também na linguagem para que, na prática, seja significativa. O anúncio deve fazer a experiência de que o Evangelho da família é a resposta aos anseios mais profundos da pessoa humana: da sua dignidade da plena realização na reciprocidade, na comunhão e na fecundidade. Não é apenas a introdução de uma normativa, mas de propor valores, respondendo às suas necessidades que se constatam hoje nos países mais secularizados.

34. A Palavra de Deus é fonte da vida espiritual para a família. Toda a pastoral familiar deverá deixar-se modelar interiormente e formar os membros da Igreja doméstica pela leitura orante e eclesial da Sagrada Escritura. A Palavra de Deus não é apenas uma boa notícia para a vida privada das pessoas, mas também um critério de juízo e uma luz para o discernimento dos vários desafios enfrentados por cônjuges e famílias.

35. Ao mesmo tempo, muitos Padres sinodais insistiram numa abordagem mais positiva à riqueza das diferentes experiências religiosas, não escondendo as dificuldades. Nesta diversidade de realidades religiosas e culturais, que caracteriza as nações, deverão ser primeiro apreciadas as possibilidades positivas e à luz destas avaliar as suas limitações e deficiências.

36. O casamento cristão é uma vocação que se acolhe com uma preparação adequada num itinerário de fé, com um discernimento maduro, e não deve ser considerado apenas como uma tradição cultural ou exigência social ou jurídica. Portanto precisam de ser feitos percursos que acompanhem a pessoa e o casal, de modo que a comunicação dos conteúdos da fé se juntem à experiência de vida oferecida pela comunidade eclesial.

37. Foi repetidamente mencionada a necessidade de uma renovação radical da prática pastoral à luz do Evangelho da família, superando as ópticas individualistas que ainda a caracterizam. Por isso se tem muitas vezes insistido na renovação da formação dos sacerdotes, diáconos, catequistas e outros agentes pastorais, através de um maior envolvimento das próprias famílias.

38. De igual forma foi sublinhada a necessidade de uma evangelização que denuncie com franqueza os condicionamentos culturais, sociais, políticos e económicos, como o espaço excessivo dado à lógica do mercado, que impedem uma vida familiar autêntica, causando discriminações, pobreza, exclusões e violência. Para isso deve ser desenvolvido um diálogo e uma cooperação com as estruturas sociais, e devem ser incentivados e apoiados os leigos que estão empenhados, como cristãos, no âmbito cultural e sócio-político.

Guiar os noivos no caminho de preparação para o casamento

39. A complexidade da realidade social e os desafios que a família enfrenta hoje exigem um maior compromisso de toda a comunidade cristã na preparação dos noivos para o casamento. É preciso lembrar a importância das virtudes. Entre elas a castidade torna-se condição inestimável para o crescimento genuíno de amor entre as pessoas. Sobre esta necessidade, os Padres sinodais foram unânimes em salientar a necessidade de maior envolvimento de toda a comunidade privilegiando o testemunho das próprias famílias, bem como a base da preparação para o matrimónio no caminho da iniciação cristã, sublinhando a relação entre matrimónio e baptismo e os outros sacramentos. Destacou-se a necessidade de programas especiais para a preparação para o matrimónio que sejam verdadeiras experiências de participação na vida eclesial e aprofundar os vários aspectos da vida familiar.

Acompanhando os primeiros anos de vida conjugal

40. Os primeiros anos de casamento são um período vital e delicado durante o qual os casais crescem cientes dos desafios e do significado do matrimónio. Daí a necessidade de um apoio pastoral que continue após a celebração do sacramento (cf. Familiaris Consortio, Parte III). É de grande importância nesta pastoral a presença de casais com experiência. A paróquia é considerada como o lugar onde os casais experientes podem estar à disposição dos mais jovens, podendo incluir associações, movimentos eclesiais e novas comunidades. Há que incentivar os esposos a uma atitude fundamental de acolhimento do grande dom que são os filhos. Sublinhe-se a importância da espiritualidade familiar, a oração e a participação na Eucaristia dominical, incentivando os casais a reunirem-se regularmente para promoverem o crescimento da vida espiritual e da solidariedade nas necessidades concretas da vida. Liturgias, práticas devocionais e celebrações eucarísticas para as famílias, especialmente no aniversário de matrimónio, foram mencionados como vitais para promover a evangelização através da família.

O cuidado pastoral das pessoas que vivem casadas pelo civil ou em coabitação

41. Embora continuando a proclamar e promover o matrimónio cristão, o Sínodo também incentiva ao discernimento pastoral das situações de muitos que já não vivem esta realidade. É importante entrar em diálogo pastoral com essas pessoas a fim de destacar os elementos das suas vidas que podem levar a uma maior abertura ao Evangelho do matrimónio na sua plenitude. Os pastores precisam de identificar os factores que podem promover a evangelização e o crescimento humano e espiritual. Uma nova consciência da pastoral de hoje é compreender os elementos positivos presentes em casamentos civis e, feitas as devidas diferenças, nas coabitações. É importante que na proposta eclesial, ao mesmo tempo que se afirma claramente a mensagem cristã, se indiquem elementos construtivos naquelas situações que ainda não correspondam ou deixaram de o fazer.

42. Observou-se também em muitos países um “número crescente de casais que vivem juntos, experimentalmente, sem qualquer casamento canónico ou civil” (Instrumentum Laboris, 81). Em alguns países, isso acontece especialmente no casamento tradicional, acordado entre as famílias e, muitas vezes celebrada em várias etapas. Noutros países, por outro lado, é crescente o número de pessoas que, depois de viverem juntos por um longo tempo, pedem a celebração do matrimónio na igreja. A mera coabitação é muitas vezes escolhida por causa da mentalidade geral contrária às instituições e aos compromissos definitivos, mas devido à expectativa de uma segurança existencial (trabalho e salário fixo). Noutros países, por fim, as uniões de facto são muito numerosas, não só pela rejeição dos valores da família e do casamento, mas também pelo facto de que o casamento é visto como um luxo, perante as condições sociais, de modo que a pobreza material obriga a que se viva em união de facto.

43. Todas estas situações devem ser abordadas de uma forma construtiva, tentando transformá-las em oportunidades de caminho em direcção à plenitude do matrimónio e da família, à luz do Evangelho. Trata-se de acolhê-las e acompanhá-las com paciência e sensibilidade. Para esse fim, é importante o testemunho atraente de autênticas famílias cristãs, como sujeitos da evangelização da família.

Cuidar de famílias feridas (separados, divorciados não recasados, divorciados recasados, famílias monoparentais)

44. Quando os noivos têm problemas nos seus relacionamentos, devem poder contar com a ajuda e orientação da Igreja. A pastoral da caridade e da misericórdia tende à recuperação de pessoas e relacionamentos. A experiência mostra que, com a ajuda adequada e com a acção da graça da reconciliação, uma grande percentagem de crises conjugais são superadas de forma satisfatória. Saber perdoar e sentir-se perdoado é uma experiência fundamental na vida familiar. O perdão entre os cônjuges permite experimentar um amor que é para sempre e nunca passa (1 Cor 13,8). Às vezes é difícil para quem recebeu o perdão de Deus ter a força para oferecer um perdão genuíno que regenera a pessoa.

45. No Sínodo soou clara a necessidade de decisões pastorais corajosas. Confirmando com firmeza a fidelidade ao Evangelho da família e reconhecendo que a separação e o divórcio são sempre uma lesão que causa sofrimento considerável aos próprios cônjuges e aos filhos, os Padres sinodais sentiram a urgência de novos programas pastorais, que começam da realidade efectiva das fragilidades familiares, sabendo que estas muitas vezes são mais assumidas com sofrimento do que escolhidas livremente. Trata-se de situações diferentes devido a factores, quer pessoais quer culturais e sócio-económicos. É preciso um olhar diferente capaz de discernir, como S. João Paulo II sugeria (cf. Familiaris consortio, 84).

46. Cada família deverá ser primeiro ouvida com respeito e amor fazendo-se companheiros de caminhada como Cristo com os discípulos na estrada de Emaús. Aplicam-se de forma especial para estas situações as palavras do Papa Francisco: «A Igreja deverá iniciar os seus membros – sacerdotes, religiosos e leigos – a esta “arte de acompanhamento”, para que todos aprendam a tirar os sapatos na frente da terra sagrada do outro (Ex 3,5). Devemos dar ao nosso caminho o ritmo salutar da proximidade, com um olhar respeitoso e cheio de compaixão, mas ao mesmo tempo saudável, livre e que incentive a amadurecer na vida cristã » (Gaudium Evangelii, 169).

47. Um discernimento particular é essencial para acompanhar pastoralmente separados, divorciados, abandonados. Deve ser acolhida e valorizada a dor daqueles que sofreram injustamente a separação, o divórcio ou o abandono, ou foram forçados romper a coabitação devido aos maus-tratos de um cônjuge. O perdão para a injustiça sofrida não é fácil, mas é um caminho que a graça torna possível. Daí a necessidade de uma pastoral da reconciliação e da mediação também através de centros de aconselhamento especializados a serem estabelecidos nas dioceses. Da mesma forma, deverá destacar-se que é indispensável assumir-se de forma leal e construtiva as consequências da separação ou do divórcio sobre os filhos, vítimas inocentes. Eles não podem não ser um “objecto” de luta e deve encontrar-se a melhor forma para superarem o trauma da divisão e crescerem da maneira mais serena possível. Em qualquer caso, a Igreja deve sempre destacar a injustiça que vem muitas vezes de uma situação de divórcio. Deve ser dada especial atenção ao acompanhamento de famílias monoparentais, de um modo particular ajudar as mulheres que têm de carregar sozinhas a responsabilidade da casa e a educação dos filhos.

48. Um grande número de Padres sublinharam a necessidade de tornar mais acessíveis e ágeis, possivelmente, totalmente gratuitos, os procedimentos para o reconhecimento dos casos de nulidade. Entre as propostas foram indicados: o superar da necessidade da dúplice sentença em conformidade; a capacidade de determinar uma via administrativa sob a responsabilidade do bispo diocesano; um processo sumário a ser iniciado em casos notórios de nulidade. Alguns Padres, no entanto, opõem-se a essas propostas porque não iriam garantir uma avaliação fiável. Deve-se ressaltar que em todos estes casos é de averiguar a verdade sobre a validade do vínculo. De acordo com outras propostas deve, então, ser considerada a importância ao papel da fé dos noivos em vista da validade do sacramento do matrimónio, mantendo que, entre baptizados, todos os matrimónios válidos são sacramento.

49. Sobre as causas matrimoniais a da simplificação do procedimento, exigido por muitos, bem como a preparação de trabalhadores suficientes, clérigos e leigos com dedicação prioritária, sublinha-se a responsabilidade do bispo diocesano, que na sua diocese poderia encarregar os consultores devidamente preparados que possam gratuitamente aconselhar as partes sobre a validade do seu casamento. Esta função pode ser realizada por um escritório ou pessoas qualificadas (cf. Dignitas Connubii, 113 Art., 1).

50. As pessoas divorciadas, mas não recasadas, que são muitas vezes testemunhas de fidelidade conjugal, devem ser encorajados a encontrar na Eucaristia o alimento que as sustenta no seu estado. A comunidade local e os pastores devem ajudá-los com cuidado, especialmente quando há crianças ou é grave a sua situação de pobreza.

51. A situação dos divorciados recasados exige um atento discernimento e acompanhamento de grande respeito, evitando qualquer linguagem e atitude que faça com que se sintam discriminados e promovendo a sua participação na vida da comunidade. Cuidar deles não é para a comunidade cristã um enfraquecimento da sua fé e do seu testemunho sobre a indissolubilidade do matrimónio, mas sim exprime precisamente nesta atenção a sua caridade.

52. Reflectiu-se sobre a possibilidade dos divorciados recasados terem acesso aos sacramentos da Penitência e da Eucaristia. Vários Padres sinodais insistiram em favor das regras em vigor no âmbito da relação constitutiva entre a participação na Eucaristia e da comunhão com a Igreja e os seus ensinamentos sobre o matrimónio indissolúvel. Outros exprimiram-se pelo acolhimento não generalizado à mesa eucarística, em algumas situações especiais e em condições rigorosas, especialmente quando se trata de casos irreversíveis e relacionados com obrigações morais para com os filhos que se sujeitariam a um sofrimento injusto. Qualquer acesso aos sacramentos deve ser precedido de um caminho penitencial sob a responsabilidade do bispo diocesano. Deve ser aprofundada a questão, tendo em conta a distinção entre a situação objectiva de pecado e circunstâncias atenuantes, como «a imputabilidade ou responsabilidade de uma acção pode ser diminuída ou até mesmo anulada» por vários «fatores psicológicos ou sociais» (Catecismo da Igreja Católica, 1735).

53. Alguns Padres argumentaram que os pais divorciados e recasados ou em coabitação podem recorrer frutuosamente à comunhão espiritual. Outros Padres perguntaram-se por que então não podem aceder à sacramental. É pedido, em seguida, um estudo do tema para se poder emergir as características das duas formas e a sua ligação com a teologia do casamento.

54. As questões relacionadas com os casamentos mistos recorrem muitas vezes nas intervenções dos Padres sinodais. A diversidade disciplinar das Igrejas Ortodoxas nalguns contextos colocam problemas que precisam de ser repensados em âmbito ecuménico. Da mesma forma, para os casamentos inter-religiosos será importante a contribuição do diálogo com as outras religiões.

O cuidado pastoral das pessoas com orientação homossexual

55. Algumas famílias vivem a experiência de ter dentro delas pessoas com orientação homossexual. Neste sentido, tem-se questionado sobre qual o cuidado pastoral apropriado perante esta situação, referindo-se o que a Igreja ensina, “Não há nenhum fundamento algum para assimilar ou estabelecer até mesmo remotamente analogias, entre as uniões homossexuais e o plano de Deus para o matrimónio e a família.” No entanto, os homens e as mulheres com tendências homossexuais devem ser acolhidos com respeito e delicadeza. “Em relação a eles devem ser evitados todo o sinal de discriminação injusta” (Congregação para a Doutrina da Fé, Considerações sobre os projectos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas homossexuais, 4).

56. É totalmente inaceitável que os Pastores da Igreja sofram pressões sobre esta matéria e que os organismos internacionais condicionem a ajuda financeira aos países pobres, à introdução de leis que estabelecem o “casamento” entre pessoas do mesmo sexo.

A transmissão da vida e o desafio da natalidade

57. Não é difícil ver a difusão de uma mentalidade que reduz a geração de vida à variável de um projecto individual ou de casal. Os factores de ordem económica exercem um peso decisivo, por vezes, contribuindo para a queda acentuada da taxa de natalidade, o que enfraquece o tecido social, compromete o relacionamento entre as gerações e torna mias incerto o futuro. A abertura à vida é uma exigência intrínseca do amor conjugal. Nesta luz, a Igreja apoia as famílias que acolhem, educam e circundam do seu afecto e do seu amor as crianças com deficiência.

58. Aqui, também, temos de começar por ouvir as pessoas e mostrar a beleza e a verdade da abertura incondicional à vida, como algo de que o amor humano precisa para ser vivido em plenitude. É nesta base que se pode apoiar um ensinamento adequado sobre métodos naturais para a procriação responsável. Ajuda-se, assim, a viver numa comunhão harmoniosa e consciente entre os cônjuges, em todas as suas dimensões, juntamente com a responsabilidade geradora. Deverá ser recuperada a mensagem da encíclica Humanae Vitae do Papa Paulo VI, que enfatiza a necessidade de se respeitar a dignidade da pessoa na avaliação moral dos métodos de regulação da natalidade. A adopção de crianças órfãs e abandonadas, aceites como seus filhos, é uma forma específica de apostolado familiar (cf. Apostolado actuositatem, III, 11), várias vezes chamado e incentivado pelo Magistério (cf. Familiaris Consortio, III, II; Evangelium Vitae, IV, 93). A escolha de assistência social e adopção exprime uma particular fecundidade da experiência conjugal, e não apenas quando esta é marcada pela infertilidade. Esta decisão é um sinal eloquente da família, uma oportunidade de testemunhar a sua fé e para restaurar a dignidade de que se viu privada.

59. É necessário ajudar a viver a afectividade, mesmo no vínculo conjugal como um processo de maturação, na aceitação mais abrangente numa doação sempre mais plena. Reitere-se, neste contexto, a necessidade de oferecer percursos de formação que alimentem a vida conjugal e a importância dos leigos que ofereçam um acompanhamento feito de testemunho vivo. É de grande ajuda o exemplo de um amor fiel e profundo feito de ternura, respeito, capaz de crescer ao longo do tempo e na sua concretização de abertura à geração da vida faz experiência de um mistério que nos transcende.

O desafio da educação e do papel da família na evangelização

60. Um dos principais desafios para as famílias hoje em dia é, certamente, a educação, tornada realidade mais desafiadora e complexa devido à realidade cultural actual e à grande influência dos media. Devem ser levadas em conta as necessidades e expectativas das famílias capazes de serem na vida quotidiana, locais de crescimento, de transmissão prática e essencial das virtudes que dão forma à existência. Isso indica que os pais podem escolher livremente o tipo de educação a dar aos filhos de acordo com suas crenças.

 61. A Igreja desempenha um papel importante no apoio às famílias, começando com a iniciação cristã, através de comunidades acolhedoras. A ela se pede hoje ainda mais do que ontem, em situações complexas, como nos mais habituais, para apoiarem os pais nos seus esforços educativos, acompanhando crianças e jovens no seu crescimento através de percursos personalizados capaz de introduzir o sentido pleno da vida e provocar escolhas e responsabilidades, vividas à luz do Evangelho. Maria, na sua ternura, misericórdia, sensibilidade materna pode alimentar a fome de humanidade e de vida, por isso é invocada pelas famílias e pelo povo cristão. O cuidado pastoral e a devoção a Maria são um ponto de partida oportuno para se proclamar o Evangelho da família.


62. As reflexões propostas, resultadas do trabalho do Sínodo realizado em grande liberdade e num estilo de escuta recíproca, uma forma de se ouvirem uns aos outros, procuram levantar questões e indicar perspectivas que deverão ser amadurecidas e pontualizadas pela reflexão das Igrejas locais no ano que nos separa da Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, prevista para Outubro de 2015, dedicado à vocação e missão da família na Igreja e no mundo de hoje. Não se trata de decisões ou perspectivas fáceis. No entanto, o caminho colegial dos bispos e a participação de todo o Povo de Deus, sob a acção do Espírito Santo, olhando para o modelo da Sagrada Família, levar-nos-á a encontrar caminhos de verdade e de misericórdia para todos. É o auspício que, desde o início dos nossos trabalhos, o Papa Francisco nos dirigiu convidando-nos para a coragem da fé e da aceitação humilde e honesta da verdade na caridade.

«Há necessidade de que se desenvolva uma nova fraternidade entre todas as famílias»


 

D. Vincenzo Paglia é o presidente do Conselho Pontifício para a Família. Em exclusivo para a Família Cristã, faz um balanço do Sínodo sobre a Família e pede que todas as famílias e comunidades se envolvam no processo de reflexão que agora se inicia, em vista do Sínodo ordinário do próximo ano.

Qual é a sua avaliação do Sínodo que se passou em Roma?
Direi que foi um acontecimento absolutamente extraordinário. E num certo sentido foi importante não apenas para a Igreja mas para todas as famílias do mundo. Poderia dizer que, sobre as costas daqueles 191 padres sinodais, realmente existia uma preocupação por todas as famílias do planeta; não somente pelas crentes, mas por todas. E eu creio que a sapiência e o olhar preventivamente avançado do Papa Francisco, que quis este longo percurso de reflexão de toda a Igreja sobre a família, deu os seus frutos. Foi um debate animado, livre, franco, em que se tocaram muitos temas – outros deverão ser ainda examinados – todavia o itinerário que se abriu no encerramento do Sínodo extraordinário é um itinerário de grande responsabilidade, além de grande interesse.

Qual será, no decurso do próximo ano, o trabalho do Conselho Pontifício para a Família sobre a Relatio Synodi, em vista à preparação do Sínodo ordinário de 2015?
O Conselho Pontifício para a Família, obviamente, está particularmente interessado na reflexão e na realização de debates múltiplos, plurais, a todos os níveis, sobre cada temática discutida durante este Sínodo. Não foi por acaso que o Sínodo quis “caminhar em conjunto”. Apesar de ter sido muito aberto, tem, todavia, que se favorecer indispensavelmente uma ulterior abertura de tal modo que as temáticas que ali foram tocadas sejam debatidas em todos os níveis. Houve debates que tiveram um caráter mais teológico, outros uma relação mais imediata com a vida pastoral, mas indubitavelmente todos somos chamados a meter no centro da nossa atenção não somente as teorias, mas também a vizinhança de todas as famílias, em relação às sãs e às feridas; às que caminham e às que coxeiam. Porque é importante que todas as famílias – mesmo as que ainda não estão marcadas pela plenitude do sacramento, ou até pela robustez de um caminho – apressem o passo e se unam numa simpatia comum de tal modo que o que já está bem amadureça plenamente. Há, pois, a necessidade de que se desenvolva uma nova fraternidade entre todas as famílias, entre as famílias crentes, entre as famílias crentes e as não-crentes, porque se volta a descobrir com clareza que a família é um património comum para toda a humanidade. 

A preparação para o matrimónio foi um dos temas discutidos no Sínodo. Como podemos integrar a pastoral do matrimónio na pastoral juvenil, catequética, privilegiando a preparação remota exigida pela Familiaris Consortio?
Todos os padres sinodais sublinharam a importância da preparação ao matrimónio, até porque o matrimónio não é uma festa, e nem é sequer um dia em que é festejado, mas é uma escolha de vida: neste sentido trata-se de fazer redescobrir que a escolha de um se casar é um chamamento, uma vocação. Ninguém se casa só para si mesmo mas para criar uma família, e para que esta família incida na sociedade e na criação. Isto significa que a preparação ao matrimónio não pode ser nem apressada nem muito menos superficial, bem pelo contrário, em minha opinião, deve representar uma ocasião para uma compreensão renovada, seja da fé, seja da vida matrimonial e familiar. Não basta por isso contentar-se com um amor romântico ou um “gostamos um do outro, ponto final”. Na realidade deve-se redescobrir a alta e difícil vocação de ser esposos, pais e promotores de ligações sociais. 

Pensa que a formação imediata ao matrimónio deva ser mais exigente?
É indispensável uma ligação dos nubentes – destes jovens que querem assumir a vida matrimonial – com a comunidade cristã. Não é possível conceber um matrimónio e uma família sem uma ligação com a comunidade cristã de referência: esta é uma das indispensáveis acentuações que devem ser promovidas. Com demasiada frequência a família anda por conta própria, como também muitas vezes a paróquia, ou a comunidade cristã, anda por conta própria. Por isso acontece que se prepara sem viver a vida da comunidade e se inicia a vida de uma nova família num ambiente onde da comunidade paroquial, ou da comunidade cristã, não se sabe nada, e nem sequer se conhece.

Em sua opinião, é justo que as dioceses exijam que os seus sacerdotes devam recusar fazer o casamento dum homem e duma mulher se estes não estiverem bem conscientes do sacramento?
Este vazio deve absolutamente ser ultrapassado e neste sentido a proposta evangélica da família não deve abaixar-se, mas deve ser sempre alta. O problema não é, se assim posso dizer, abaixar a meta, mas deve-se reforçar o acompanhamento com ela, e isto comporta um envolvimento de todos: dos esposos, dos operadores pastorais, e da própria comunidade cristã, que acolhe e acompanha cada jovem família.
É evidente então que o sacerdote ou o grupo pastoral que acolhe os jovens nubentes devam fazer crescer neles a consciência. Portanto é sempre uma perda, é uma derrota deixar cair esta questão. Nunca mandar ninguém para trás. A mecha que ainda fumega não seja apagada, mas reavivada e reativada para se tornar uma chama ardente. Por isso eu sou completamente contrário a mandar para trás, pelo contrário, deveríamos ser despachados para trás nós se não formos capazes de ajudar. 

Além da questão da preparação, muitos falaram da necessidade do acompanhamento dos casais, estejam eles em crise ou não. Como fazer isto?
Eu creio que aqui devemos redescobrir uma grande sapiência. Infelizmente muitos matrimónios, tantas famílias, rompem-se porque estão sozinhos, abandonados. Por isso nós devemos estar perto destas pessoas antes da crise, mais ainda durante a crise, e acompanhá-las esperando que obviamente tudo se resolva. Se depois sucedem fraturas devemos estar ao lado e compreender. E onde se descobre que o matrimónio não existiu, deve-se obviamente facilitar os procedimentos de nulidade, sem que isso porém signifique um alegre cancelamento. 

Como podem os sacerdotes ajudar nesta tarefa?
Estar perto dos matrimónios que se fraturam é um dos grandes desafios que o Sínodo pediu para enfrentar e que sobretudo o Papa Francisco quer que todos os pastores e compreendam. E a vizinhança faz encontrar também caminhos, se não de solução, certamente de acompanhamento. É uma arte acompanhar todos; é uma arte ainda mais sofisticada a de acompanhar os feridos. Quanto tempo é preciso para ter um doutoramento em medicina, para operar, para ajudar a manter a saúde? Eu creio que o mesmo seja necessário para acompanhar, para fazer crescer bem, para curar quando as doenças do espírito enfraquecem ou fraturam coexistências que deveriam reencontrar um novo vigor e uma nova primavera.

Entrevista: Ricardo Perna
Fotos: Ricardo Perna e News.va

28 de outubro de 2014

«Muitas vezes o que afasta as pessoas é a atitude da comunidade, e não a doutrina da Igreja»


Maria Giovanna Ruggieri é a presidente da União Mundial das Organizações Femininas Católicas (UMOFC), tendo sido reconduzida no cargo na Assembleia-geral que decorreu esta última semana em Fátima, onde 500 membros desta união mundial se juntaram para falar sobre o papel da mulher na Igreja. Sobre o Sínodo da Família, onde dois dos membros da união se pronunciaram enquanto leigos, a presidente da UMOFC faz uma avaliação positiva e lamenta que os media generalistas tenham reduzido a discussão alargada a «apenas dois temas», a comunhão dos recasados e as pessoas com tendências homossexuais.

Como é que viu o sínodo sobre a Família?
Vi de uma forma positiva, porque o clima foi muito aberto, as pessoas puderem falar abertamente sobre os assuntos, e isso é muito bom. A ideia de que estamos num local tão importante, com toda a hierarquia, e temos a possibilidade de falar de todas as nossas dificuldades, é muito bom. Este foi um passo em direção ao sínodo do próximo ano, e é importante perceber como o conteúdo deste sínodo pode ser refletido e discutido ao nível local e ver o que volta para discussão em outubro do próximo ano.

Foram colocadas muitas propostas em cima da mesa. Quais foram as mais significativas para si?
Não acho que seja importante destacar um ou outro ponto. Lamento que, nos media, apenas se tenha falado de dois assuntos, e não se prestou atenção a todo o trabalho de reflexão em conjunto, que é muito importante. O Papa disse que não havia dúvidas sobre a indissolubilidade do matrimónio, da abertura à vida dos casais, ou da noção de que o casamento é entre um homem e uma mulher. Estes princípios não foram colocados em causa, são a base da nossa doutrina. Os media apenas transmitiram estes assuntos, aplicaram categorias sociais à Igreja, e esqueceram que a Igreja não é uma democracia, é um corpo em que todos tendem à comunhão. É por isso que é muito fácil degenerar para as questões do poder, em detrimento do serviço. Se eu achar que estou trabalhar numa carreira, para o poder, é mau, mas se eu me lembrar que estou a trabalhar para a comunidade, tudo será mais fácil. Claro que podemos ter opiniões diferentes, mas o que é importante é não quebrar a comunhão, e a mim parece-me que o Sínodo não quebrou a comunhão. Sim, em dois assuntos houve diferença de opiniões, mas a maioria esteve de acordo em todos os casos. Eu vejo o Sínodo como um exercício de comunhão, um caminho em conjunto.

Mas se há desafios que precisavam de ser abordados, é porque algo tem de mudar…
Sim, há. Os participantes falaram dos desafios da migração, que são terríveis. Mulheres da Ucrânia ou da Roménia que deixam os seus filhos com os avós para virem trabalhar para outros países, é um desafio que tem de ser abordado. Ou mulheres da América Latina onde a figura do pai não existe. Não são apenas as questões dos divorciados e recasados ou homossexuais, como os media tentaram fazer perceber. Veja a falta de trabalho. O que fazemos com os jovens que não podem casar porque não têm emprego permanente? Como conciliar essa instabilidade com um casamento e com filhos? Temos de olhar para todos os desafios, não apenas alguns…
Penso que temos muitos assuntos que precisam de ser abordados, e espero que venham a fazer parte da pastoral familiar nas paróquias. Por vezes, quando preparamos os casais para o matrimónio, estas questões não são abordadas, e acho que esta preparação deveria incluir isto.

A preparação para o matrimónio pode ser a solução?
Não digo que seja a solução para tudo, mas é importante que as pessoas tenham noção dos problemas que vão enfrentar. E tenho de dizer outra coisa: deveríamos também perceber que os casais que decidem casar têm de ser apoiados. A minha sobrinha tem 32 e dois filhos, e já esteve desempregada, o que foi muito complicado. Quando ela estava grávida do segundo filho e estava com dificuldades, alguém lhe sugeriu uma alternativa que ela se recusou a aceitar. O que é que fazemos com estas pessoas? Dizemos que elas têm de casar e ter filhos, mas depois, como comunidade, não as apoiamos? Um casal que tem de vir viver para uma grande cidade e não tem ninguém que lhe fique com os filhos, o que fazemos? Qual é a importância da comunidade neste trabalho? Em qual comunidade os casais podem deixar os seus filhos com alguém para que possam até ir comer um gelado como casal, porque é importante para a sua relação que o façam? Estas são pequenas questões, mas que devem ser refletidas para chegarmos a uma conclusão.

As comunidades devem organizar-se para isso?
Sim, porque não? Em vez de julgarem, ou de ficarem a apontar o dedo a dizer “ah, ela é divorciada, não pode comungar”, devemos oferecer as nossas mãos para ajudar, e não para apontar e dizer que ele ou ela não fazem parte da comunidade.

É uma questão de atitude?
Sim, muitas vezes o que afasta as pessoas é a atitude da comunidade, e não a doutrina da Igreja. O Papa Francisco diz-nos muitas vezes que a misericórdia de Deus é tão grande, e mesmo assim nós damos mais importância à lei. Nós esquecemo-nos disto, e apenas aplicamos a lei, em certos casos, e esquecemos a misericórdia. Eu concordo com a lei, mas podemos fazer outras coisas para acolher as pessoas, para lhes dizer que são filhas de Deus e não foram esquecidas…

Entrevista: Ricardo Perna
Fotos: Rita Bruno

27 de outubro de 2014

Papa pede preparação mais exigente para o matrimónio


O Papa Francisco afirmou sábado aos peregrinos do movimento de Schöenstatt que se deslocaram ao Vaticano para comemorar os 100 anos da fundação do movimento que «a família cristã e o sacramento do matrimónio nunca foram tão atacados como agora, direta ou indiretamente», em virtude da cultura contemporânea da «cultura do deitar fora», ou relativismo. «Não se pode reduzir o sacramento do matrimónio a um rito social. O casamento é para sempre», lembrou, ressalvando «que na sociedade, hoje, é comum a cultura do provisório».

Neste âmbito, Francisco falou sobre a importância da preparação para o matrimónio, e, ao contrário dos bispos que, reunidos em Sínodo, afirmaram não ser conveniente «complicar os ciclos de formação», o Papa referiu que «a primeira coisa é não confundir casamento com festa, simplificando assim o rito». «Fazer o curso de preparação ao sacramento com duas aulas é um nosso pecado de omissão», completou o Santo Padre.

Neste sentido, Francisco afirmou ainda aos 7 mil peregrinos presentes na sala Paulo VI no Vaticano que a missão da Igreja é ajudar «corpo a corpo», não fazendo «proselitismo», mas acompanhando. «A Igreja não cresce por proselitismo, mas por atração», disse, citando Bento XVI.

Questionado sobre o casamento e que conselho ele pode oferecer para aqueles que não se sentem bem-vindos na Igreja, o Papa Francisco destacou a necessidade dos sacerdotes ficarem perto de cada uma das ovelhas do seu rebanho «sem se escandalizarem com o que acontece dentro da família». Francisco contou que um bispo, durante o recente Sínodo sobre a família, perguntou se os padres estão conscientes do que as crianças sentem e os danos psicológicos causados ​​quando os seus pais se separam, observando ainda como, por vezes, o pai que se está a separar permanece a viver em casa a tempo parcial com as crianças, no que ele descreveu como uma «nova e totalmente destrutiva» forma de coabitação.

Texto e foto: Ricardo Perna

21 de outubro de 2014

Patriarca diz que Sínodo «marca nova fase de vida na Igreja»


O Patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, considera que a «metodologia» utilizada por Francisco neste Sínodo dos Bispos vai «marcar uma nova fase na vida da Igreja». O Patriarca de Lisboa falou hoje em conferência de imprensa sobre os dias que passou no Vaticano, em representação da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), e fez uma avaliação muito positiva. «O que o Papa inaugurou foi uma forma de exercer a colegialidade constante, e está a criar uma nova forma de viver a Igreja. Tudo se falou com a maior franqueza, com muito ímpeto», considerou D. Manuel Clemente, que sublinhou o «ineditismo» desta reflexão sinodal. «Nestas duas semanas o ponto mais salientado foi a bondade, a importância e a conveniência da proposta cristã sobre a família quando ela é realmente vivida e devidamente proporcionada, e o contraponto foram as realidades que hoje se apresentam e que não podemos esconder, colocando a cabeça na areia», sustentou.

Sobre esses desafios, o Patriarca de Lisboa destacou «a fragilidade dos vínculos familiares, dos vínculos duradouros, as uniões de facto, no campo interno da Igreja as famílias que foram reconstituídas civilmente mas não sacramentalmente e o problema das pessoas com tendências homossexuais». Estes e outros aspetos apareceram com propostas concretas no polémico relatório preliminar, feito no final da primeira semana de congregações gerais, que originou muitas reações negativas, em virtude do mediatismo que atingiu. «Este impacto provocou um certo recuo nos círculos menores, que transpareceu nos trabalhos de grupo. As afirmações mais polémicas foram muito mitigadas, e nos trabalhos de grupo começaram a surgir algumas questões sobre como colocar estas questões para o futuro, e julgo que a reconsideração disto em termos de prós e contras levou a que nas votações da mensagem e do Relatio Synodi esses pontos não tivessem tantos pontos a favor», disse o Patriarca, que acrescentou que a reação de «defesa» foi «legítima». «O relevo desses pontos polémicos era excessivo em relação ao que eu tinha ouvido nas congregações gerais. Os padres sinodais não se sentiram refletidos no conjunto desses dois artigos, não tanto pelo conteúdo dos mesmos, mas pela mediatização que tiveram», disse aos jornalistas.

O facto de não terem sido aprovados alguns pontos com a maioria de 2/3 necessária não incomoda o Patriarca, que se mostrou satisfeito pelo facto de terem surgido no relatório final. «O facto de se terem mantido é muito positivo. Entre o que estava no relatório preliminar e a vontade dos círculos menores em retirá-los por completo, ganhou o equilíbrio de nem omitir as propostas, nem dizer que eram a vontade do Sínodo», afirmou o presidente da CEP.

Questionado sobre este Sínodo teria sido uma forma do Papa Francisco «apalpar terreno» a eventuais mudanças na Igreja, D. Manuel Clemente afirmou que desconhecia essa intenção. «Se o Papa Francisco quis apenas testar o impacto das propostas, ganhou. O aplauso no final do discurso do Papa foi sinal do apoio que o Papa tem em todo o episcopado mundial», considerou o prelado.

Assumindo que a doutrina da Igreja não deve mudar no final deste caminho sinodal, D. Manuel Clemente sempre vai avisando que «a verdade objetiva» da doutrina «é captada pela relatividade do ser humano», pelo que é importante perceber que se podem refletir todas as questões. «Também há 50 anos atrás se achava que o problema da liberdade religiosa não teria solução, e foi possível encontrá-la», lembrou.

Sobre a necessidade de preparação para o matrimónio, o Patriarca descartou uma preparação imediata mais longa no imediato, e prefere um plano mais alargado no tempo que, segundo o próprio, conduzirá a esse aumento da exigência. «Tem de ser a comunidade a tornar natural essa maior exigência na preparação para o matrimónio. Para isso, é preciso uma centralidade reforçada da dimensão familiar nas comunidades cristãs», disse o prelado.

Sobre a formação do clero e a contribuição das famílias, outra das propostas lançadas durante o Sínodo, D. Manuel Clemente afirmou que «a ligação do clero com a igreja doméstica está presente desde o início do Cristianismo, e foi mais longe na proposta dos bispos. «Faz sentido que as famílias possam dar formação aos seminaristas e também ao próprio clero na sua formação contínua», concluiu.

20 de outubro de 2014

O Sínodo do diálogo e da partilha

O Sínodo que terminou este domingo em Roma marcou um ponto de viragem na Igreja, mas não aquele que muita comunicação social anda por aí a apregoar. Não foram os conservadores que ganharam alguma coisa, ou os liberais que libertaram a Igreja da prisão conservadora em que habitava. A viragem foi precisamente na abertura e na transparência que se viram durante as duas semanas de trabalho, e até antes. Às acusações de uma Igreja fechada e “secreta”, o Papa respondeu com indicações claras: fale-se de tudo sem se esconder nada. E de tudo o que foi falado dentro de portas foi dado a conhecer fora de portas com uma velocidade e eficiência impressionantes. Que outra organização, ou estado, consegue produzir documentos para a comunicação social minutos após serem discutidos, apresentados ou votados, ou sequer resumos de debates longos? E com a transparência de até publicar os votos individuais em cada um dos pontos do relatório final? Ou sequer que permita que todos os participantes falassem abertamente à comunicação social sobre todos os assuntos que estavam a ser debatidos no Sínodo, e sobre as suas intervenções?

Hoje em dia, quem quiser estar informado sobre a Igreja e o que está em causa neste Sínodo, pode fazê-lo, consultando a muita informação disponível nos meios de comunicação social que, de forma mais objetiva nuns casos ou mais parcial noutros, mostram os diversos argumentos e os vários pontos de vista sobre todas as situações mais ou menos polémicas. Este tipo de abertura é rara nas grandes ou pequenas instituições, e uma prova de que a Igreja continua, em muitos campos, a estar anos à frente de outras organizações.

No que toca a conclusões, a mais importante de todas ficou espelhada no discurso do Papa Francisco aos bispos no final da assembleia sinodal. «A Igreja é de Cristo – é a sua esposa – e todos os bispos, em comunhão com o Sucessor de Pedro, têm a missão e o dever de custodiá-la e de servi-la, não como donos, mas como servidores. O Papa, neste contexto, não é o senhor supremo, mas sim um supremo servidor – o “servus servorum Dei”; o garante da obediência e da conformidade da Igreja à vontade de Deus, ao Evangelho de Cristo e à Tradição da Igreja, deixando de lado todo arbítrio pessoal, mesmo sendo – por vontade do próprio Cristo – o “Pastor e Doutor supremo de todos os fiéis” (Can. 749) enquanto gozando “da potestade ordinária que é suprema, é plena, imediata e universal na Igreja” (cf. Cann. 331-334)». Ou, trocado por miúdos: “discutam e ponham tudo em cima da mesa, mas não se esqueçam que o Sínodo é cum Petro et sub Petro (feito com a presença do Papa e sob a sua supervisão), e no final quem vai decidir sou eu e todos devem aceitar a minha decisão”.

Com este simples parágrafo, o Papa Francisco esclareceu toda a discussão e pôs todos no seu lugar, conservadores e liberais. Porque, no final de contas, o Sínodo é “apenas” um órgão consultivo, que nada vincula na Igreja. A sua tarefa é a de dar a conhecer ao Papa a realidade da Igreja e as propostas que cada pastor tem para a Igreja universal. Neste sentido, foi um Sínodo perfeito, que lançou as bases para, durante o próximo ano, «amadurecer, com verdadeiro discernimento espiritual, as ideias propostas e encontrar soluções concretas às tantas dificuldades e inumeráveis desafios que as famílias devem enfrentar», como também referiu o Papa no seu discurso.

Agora é tempo de olhar para o relatório final e refletir sobre as propostas que lá são feitas, que davam toda uma outra reflexão. O Papa agradece o contributo de todos, e não rejeita nenhuma opinião. Sempre sabendo que, no final, é a opinião dele que será vinculativa, nenhuma das outras…

Texto: Ricardo Perna
Jornalista da Revista Família Cristã
Foto: News.va

19 de outubro de 2014

«A família é a melhor maneira de anunciar Jesus Cristo»


O Pe. Duarte da Cunha esteve hoje nas Jornadas da Pastoral Familiar para falar sobre o Sínodo dos Bispos aos participantes nas jornadas. O sacerdote português, que é secretário-geral do Conselho das Conferências Episcopais da Europa (CCEE), faz uma avaliação positiva do relatório final, que considera «uma manta de retalhos cheia de coisas importantes». «É o resultado dos assuntos debatidos pelos bispos, é um texto de trabalho, não final, que é preciso ser lido e relido, mas também complementado com outros textos que devem ser usados», considerou.

Segundo o sacerdote, «as verdades da família foram reafirmadas e apreciadas sempre com a preocupação de perceber como anunciar hoje essas verdades». «É uma das insistências do Papa Francisco. É preciso acompanhar as famílias para se poder anunciar o Evangelho da família», defendeu o Pe. Duarte da Cunha.

Falando aos jornalistas no final da conferência, o secretário-geral da CCEE considerou que a «tónica no acolhimento» esteve presente nas intervenções e «é explícita» em todo o relatório final do Sínodo, lançando «desafios de empenho aos agentes pastorais».

Quanto às questões mais sensíveis, o Pe. Duarte da Cunha não acha que tenha havido novidade. «Surgiu a necessidade de a Igreja passar a sua mensagem de uma forma mais acolhedora, e isso é bom, mas no conteúdo nada mudou. Tudo o que foi dito já havia sido dito antes», sustentou o sacerdote português, que não considera possível grandes alterações em relação a divorciados recasados ou em relação aos homossexuais. «Dar a comunhão aos divorciados a recasados não resolve o problema. Aliás, nos países em que isso se defende com maior vigor, a pastoral de acompanhamento que é feita é tão pouca que se transforma numa pastoral de indiferença, e não é isso que é o acolhimento», garantiu o Pe. Duarte da Cunha.

Quanto aos homossexuais, é «essencial que haja acolhimento e que ninguém se sinta discriminado n Igreja», diz o sacerdote, mas sem com isso obrigar a que a Igreja mude o seu ponto de vista sobre essas questões. «As nossas comunidades sempre tiveram pessoas com tendências homossexuais, que fazem o seu caminho, por vezes com sofrimento, mas lidando com as suas tendências, da mesma forma que um heterossexual também lida com as suas questões, e isso já se fazia antes», garantiu o Pe. Duarte da Cunha.

Os desafios do próximo ano, em vista ao Sínodo
Na conferência proferida esta manhã, o Pe. Duarte da Cunha referiu três pontos como sendo os desafios do próximo ano, em vista à preparação do sínodo ordinário de 2015. «É importante olharmos para a antropologia do ser humano e da família. Temos de compreender a pessoa humana como única, mas integrada numa rede social», disse o sacerdote, argumentando que a noção de imediato na sociedade é impeditiva da constituição de família. «Quando deixamos de desejar o eterno e apenas queremos gozar o presente, somos incapazes de construir uma família», disse o Pe. Duarte da Cunha.

Um segundo aspeto é o de repensar e recuperar a teologia do matrimónio. «O que o torna único, como se prepara, como se vive, como se põe a render as graças, quais são elas. O que faz desse consentimento único e o que isso implica. Há um diálogo entre o homem que oferece a graça e Deus que a recebe. Os sacramentos não são só futuro, são presente que acontece. O casamento indissolúvel é-o porque Deus assim o torna, e não se pode desfazer», considerou o sacerdote.

Depois destas questões, surge a necessidade de pensar nas questões deixadas pelo relatório final do Sínodo, que será utilizado como Lineamenta do sínodo do próximo ano, de pensar na teologia do amor. «Há uma confusão generalizada sobre o que é o amor. O que se fala nos filmes e nas novelas não é o mesmo que a Madre Teresa falava. Quando Jesus Cristo diz “amai-vos como Eu vos amei”, ou seja, deem a vossa vida pela pessoa com quem estão, amar é dar tudo e dar-se a si mesmo», disse.  

Isto porque, defende o sacerdote, o amor não é apenas dar sem esperar nada receber. «Diz-se que o amor deve ser gratuito, sem esperar nada contra, mas o amor perfeito é um querer ser amado. Amar e ser amado não podem ser duas coisas separadas, têm de estar juntas. O amor verdadeiro é um amor que suplica. Amor gera amor. Amor não é apenas dom, é comunhão», exortou o Pe. Duarte da Cunha.

Nesta linha de ideias, o Pe. Duarte da Cunha encerrou os trabalhos defendendo a importância da Pastoral Familiar para a Igreja e para o homem. «A primeira razão pela qual vale a pena o empenho na família é pela nossa própria família. Isto não é egoísta, mas é pôr o nosso interesse no centro. Se estou empenhado em viver melhor a minha vida, os meus irmãos recebem eco desse empenho e isso é bom para eles», defendeu.

Depois, há a questão da caridade e da evangelização. «Não posso estar ao lado de pessoas que passam problemas e ser indiferente, tenho de ter caridade», afirmou, acrescentando que «a família é a melhor maneira de anunciar Jesus Cristo, é ali que tudo começa». «Onde há famílias cristãs, é mais provável que haja filhos cristãos», concluiu, avisando que as famílias não são somente objeto de evangelização, mas sobretudo «sujeitos de evangelização como seu testemunho».

Texto e Fotos: Ricardo Perna

Missa de encerramento do Sínodo e beatificação de Paulo VI

Foi beatificado esta manhã em Roma, na praça de São Pedro e perante 70.000 fiéis, o Papa Paulo VI.
Na celebração, que foi simultaneamente a de encerramento do Sínodo, o Papa Francisco recordou um homem humilde que soube “dar a Deus o que é de Deus” e agradeceu por todo o seu trabalho de serviço à Igreja. “Obrigado, nosso querido e amado Papa Paulo VI! Obrigado pelo teu humilde e profético testemunho de amor a Cristo e à sua Igreja!”

Referindo-se a Paulo VI como o grande “timoneiro do Concílio”, num contexto “secularizado e hostil”, Francisco reforçou o papel do beato na condução da Igreja como “mãe amorosa de todos os homens e medianeira de salvação» (Carta enc. Ecclesiam suam, prólogo).”

Invocando o papel do Sínodo na contribuição para esta missão, Francisco recorreu às palavras de Paulo VI para relembrar o objetivo de “caminhar juntos” (significado de Sínodo). “Ao perscrutar atentamente os sinais dos tempos, procuramos adaptar os métodos (...) às múltiplas necessidades dos nossos dias e às novas características da sociedade”.


Em jeito de balanço, o Santo Padre afirmou que a caminhada destes dias foi de trabalho “com verdadeira liberdade e humilde criatividade”. O Papa invocou o Espírito Santo para que “continue a acompanhar o caminho que nos prepara, nas Igrejas de toda a terra, para o Sínodo Ordinário dos Bispos no próximo Outubro de 2015, com a garantia de que a Igreja continuará a trabalhar. “Semeámos e continuaremos a semear, com paciência e perseverança, na certeza de que é o Senhor que faz crescer tudo o que semeámos (cf. 1 Cor 3, 6)”.

Texto: Rita Bruno
Foto: Sala de Imprensa da Santa Sé